terça-feira, 6 de outubro de 2009

Poesia (03)

QUESTÃO DE PONTUAÇÃO, de João Cabral

Todo mundo aceita que ao homem
cabe pontuar a própria vida:
que viva em ponto de exclamação
(dizem: tem alma dionisíaca)

viva em ponto de interrogação
(foi filosofia, ora é poesia);
viva equilibrando-se entre vírgulas
e sem pontuação (na política)

o homem só não aceita do homem
que use a pontuação fatal:
que use, na frase que ele vive,
o inevitável ponto final.

Fonte: Poesia Completa.

2 comentários:

Anônimo disse...

Como eu adoro este poema!
Realmente é muito difícil para maioria de nós aceitar o ponto final - não somente aquele que é imposto à vida, mas também aqueles que põem termo a tudo aquilo que nos faz de certa forma felizes e ou inconformados. Mas, ainda bem que, graças a Deus, foram criadas as reticências! Elas servem para nos mostrar que, por aqui, o ponto até pode ser final, mas que, em algum outro lugar do universo, talvez ainda haja chance de permanecermos felizes, desta vez infinitamente...

Grande, abraço!

Jefferson de Morais.

Anônimo disse...

Querido Mestre, queria desejar a você e toda sua família um Feliz Natal com versos de Cabral:

CARTÃO DE NATAL

João Cabral de Melo Neto

Pois que reinaugurando essa criança
pensam os homens
reinaugurar a sua vida
e começar novo caderno,
fresco como o pão do dia;
pois que nestes dias a aventura
parece em ponto de vôo, e parece
que vão enfim poder
explodir suas sementes:

que desta vez não perca esse caderno
sua atração núbil para o dente;
que o entusiasmo conserve vivas
suas molas,
e possa enfim o ferro
comer a ferrugem
o sim comer o não.


beijos,
saudade,

Juliana V. Echeverri