O texto do Acordo interveio na descrição
gramatical e gerou situações
embaraçosas para o pesquisador,
professor, estudioso
– especialmente nos
assuntos de morfologia.
Por exemplo,
não é mais
permitido o uso
de hífen depois
dos elementos “não”
e “quase”. Antes,
se escrevia “não-agressão”, “não-eu” ou “quase-contrato”,
“quase-irmão”. Agora, essas palavras se escrevem sem
hífen. Um
pequeno problema
seria identificar, após a
mudança, qual
a classe gramatical
de “não” e “quase”
nesses sintagmas (advérbios?
palavras denotativas?). Problema maior mesmo, porém, é
explicar que
“não” e “quase”,
embora separados das suas palavras
parceiras por espaço
em branco,
continuam sendo chamados de “prefixos”
(sic) nas páginas de nossas leis
ortográficas... Criou-se então a estranha figura
do prefixo que
não está agregado
ao radical (in+feliz
= infeliz) nem
está separado dele por hífen (pré+barroco
= pré-barroco). Existe (?) agora o prefixo que se separa do radical
por um
espaço em
branco (não
+ cooperação = não
cooperação).
Além disso, há casos que apresentam
a identificação, descrição
e classificação de morfemas pela tradição
praticada em Portugal, colocando em xeque o que já se consolidou
em nossas terras.
Pelo texto
do Acordo, lê-se que
prefixos são
elementos que
atuam na composição – quando para nós, diferentemente,
prefixação é um
caso de derivação.
São situações
que precisam ser
esclarecidas, como também
as que envolvem antigos
substantivos compostos
(pé-de-moleque, mula-sem-cabeça),
que assumem o status de locuções substantivas, expressões
idiomáticas (pé de moleque,
mula sem
cabeça). Perdem, portanto,
a condição de “palavra”,
já que
o desaparecimento dos hifens tirou delas
a feição de unidade
lexical.
Outro dado
relevante sobre
esta edição se refere à atualização das informações bibliográficas, à inclusão
da questão de morfologia
proposta no Enade 2011 e à inserção de um Índice por Assunto – lacuna resolvida com a competente
ajuda do colega
André Conforte.
O leitor
desta quarta edição
deve então considerá-lo sob essa perspectiva.
Em resumo:
novas explicações,
novos comentários
e novos exercícios,
pois também nos estudos da língua “Viver é etcétera”...
Um comentário:
Olá, Grande Mestre.
Como vai?
Matéria interessante (?) ou difícil? Há pouco, fiz parte de um pequeno (ao mesmo tempo maravilhoso) curso de "Estilística". Nosso Mestre teceu alguns comentários sobre as alterações a que o senhor fez referência no texto em tela. A maioria fazendo menção a fatos que o desagradaram. Ele se referiu, também, à questão da utilização ( ou não) do hífen. Disse que mesmo após quase quarenta anos de magistério, vezes e vezes tem que recorrer à Gramática para compor determinada palavra. Parece-me que essa questão ficou ainda pior. A Gramática, ainda hoje, é "ensinada" como algo estanque, como algo a ser decorado, em vez de ser - segundo penso - algo assimilado dentro do contexto literário. O ensino estanque da Gramática assusta muita gente, como sempre me assustou ( o meu primário e ginasial são dos anos de 60 e 70 - são do tempo que a vírgula deveria ser colocada quando nos faltasse ar para continuar o processo respiratório)e continua me assustando. Estudo-a diariamente, mas entre mim e ela existe um fosso céltico. Entretanto, deleito-me (e já estou até mesmo relendo) com a leitura da "Gramática Histórica", de Ismael de Lima Coutinho, enquanto me aguarda a ilustre professora Hilma Ranauro. Professor, parece-me que esse "acordo" foi feito com muita pressa; foi feito sem pensar nas inúmeras consequencias negativas que trouxe à luz. Creio, solitariamente, que a nossa Gramática deve ser algo totalmente independente das demais Gramáticas dos países que falam e escrevem a língua portuguesa. O "Sermo Vulgaris" resistiu há mais de 350 anos de dominação Bárbara para chegar aos povos - creio - liberto. O Português não tem dono; ele é o efeito da resistência imensurável e sempre louvável do "povão" de nações várias, até distantes; ele é sinônimo de luta por libertação, e toda luta por libertação não pode acabar na Bastilha. Acho que é necessário o esforço para respeitarmos mais o nosso Português, assim como - esforço igual - deixar que o Português alheio siga seu caminho. Nossas influências linguísticas sofridas não são - por exemplo - as mesmas que sofreram os ibéricos. Os portugueses se acham independentes, ao ponto de nos criticarem e "troçarem" o nosso falar e escrever. Pois não: que eles vivam em paz, sempre lembrando que em paz necessitamos nós de viver primeiro. Abraço. ED.: lembremo-nos sempre do que nos disse Almeida Garretti (grafia incerta) quando veio nos visitar. Ele, português, disse-nos para parar de imitar as copiar de Europa, para encontrarmos o nosso próprio caminho.
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