Como nossa “antena” reagiria diante da palavra “canhão”? Ela
está presente numa música de Geraldo
Vandré que se tornou um hino de resistência à ditadura: “Pra não dizer que não
falei das flores” (1968, lp “Festival da Canção”).
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não
Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Caminhando e cantando
E seguindo a canção...
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer - (2 vezes)
Pelos campos há fome
Em grandes plantações
Pelas ruas marchando
Indecisos cordões
Ainda fazem da flor
Seu mais forte refrão
E acreditam nas flores
Vencendo o canhão...
A palavra “canhão” está usada metonimicamente nessa música.
Aliás, há duas metonímias se confrontando nesse trecho: as flores, que representam a paz, e o canhão, que representa a guerra.
Observemos agora o trecho final:
Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Somos todos soldados
Armados ou não
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não...
Os amores na mente
As flores no chão
A certeza na frente
A história na mão
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Aprendendo e ensinando
Uma nova lição...
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...
A letra de Geraldo Vandré está quase toda em linguagem
figurada. Se repararmos no estribilho a expressão “Quem sabe faz a hora / Não
espera acontecer”, é claro que não tomaremos seu sentido literalmente, pois
ninguém faz a hora. A metonímia aqui se refere ao que simboliza essa palavra:
“hora” é “tempo” e “tempo” é a própria vida. Quem sabe, age, decide sua vida;
não espera acontecer...
Fonte: Léxico e Semântica: estudos produtivos sobre palavra e significação, 1a. edição (Rio de Janeiro: Elsevier, 2011).
Nenhum comentário:
Postar um comentário